A Síndrome de Down é uma alteração genética bem conhecida de todos e que pode provocar o nascimento de pessoas com certa deficiência de aprendizado, assim como algumas alterações anatômicas. Do ponto de vista genético, é considerada uma cromossomopatia (trissomia do cromossomo 21) e seu diagnóstico de certeza, durante a gravidez, pode ser feito mediante a análise direta do material genético do feto, obtido da placenta, por meio de biópsia de vilo corial, ou do líquido amniótico, por amniocentese. No entanto, estes dois métodos invasivos apresentam um risco de abortamento e/ou parto prematuro de cerca de 1-2%, mesmo quando realizado nos melhores centros de medicina fetal do mundo. Este risco, associado aos elevados custos dos procedimentos, inviabiliza sua realização como rotina na população de gestantes. A utilização de um adequado método de rastreamento, no entanto, permite a identificação das gestantes que apresentem maior risco de ter um bebê com Síndrome de Down selecionando aquelas às quais se deve oferecer a possibilidade de diagnóstico definitivo.
O primeiro método utilizado para o rastreamento da Síndrome de Down foi a idade materna avançada (superior a 35 anos), o qual permite identificar cerca de 30% dos casos.
No final dos anos 80 foi introduzido outro método de rastreamento o qual levava em conta não apenas a idade da paciente, mas também a dosagem, na circulação materna, de várias substâncias produzidas pelo feto e pela placenta (alfa-fetoproteína, estriol e gonadotrofina coriônica humana). Realizado durante o segundo trimestre da gravidez, o chamado “teste triplo” permite a detecção de cerca de 60% dos casos de trissomia do cromossomo 21.
Mais recentemente, um novo método tem se mostrado ser o mais efetivo no rastreamento da Síndrome de Down: a translucência nucal.
Translucência Nucal
Todo bebê, durante a gestação, acumula uma quantidade de líquido na região posterior do pescoço. Este “excesso” de líquido pode ser visualizado ao exame ultrassonográfico como translucência nucal, a qual se encontra aumentada nos fetos portadores da Síndrome de Down. Realizada durante o primeiro trimestre da gravidez (mais precisamente entre 11 e 14 semanas), a medida da translucência nucal, associada à idade materna, permite a detecção de 75-80% dos casos de trissomia do cromossomo 21 tornando este o mais efetivo método de rastreamento da Síndrome de Down. Àquelas pacientes cujos fetos apresentem uma translucência nucal aumentada, deve-se oferecer a possibilidade de diagnóstico de certeza. Esta vantagem do diagnóstico mais precoce não pode ser subestimada, mesmo em países, como o Brasil, onde a interrupção da gestação não é uma alternativa legal.
Além de permitir a detecção dos casos de Síndrome de Down, a translucência nucal proporciona a identificação pré-natal de cerca de 70% dos casos de outras anomalias cromossômicas menos comuns (trissomia do cromossomo 13, trissomia do cromossomo 18, síndrome de Turner e triploidia), além de, quando aumentada, estar associada a anomalias cardíacas e a uma variedade de displasias ósseas e raras síndromes genéticas.
Embora a medida da translucência nucal e subsequente acesso ao risco individual da paciente para a Síndrome de Down tenha sido o principal motivo da disseminação do exame ultrassonográfico de primeiro trimestre nos países da Europa, a importância deste vai muito além. Ele permite, ainda, a confirmação da viabilidade da gestação em curso, a acurada datação da gravidez, o diagnóstico precoce de várias anomalias fetais e o diagnóstico de gestações gemelares, com uma confiável determinação da sua corionicidade, fator determinante do seu prognóstico.
A translucência nucal pode ser realizada pelas vias transabdominal ou transvaginal. A utilização de um equipamento de boa qualidade é indispensável, assim como, o adequado treinamento dos profissionais, os quais devem estar capacitados a obter imagens de alto padrão de qualidade, de acordo com as normas já mundialmente consagradas.
Prof. Dr. Marcelo Aquino
Professor Adjunto de Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Bahia-UFBA